29 de julho de 2022

Cruzo a porta de saída do aeroporto de Milão e mal posso acreditar: finalmente, estou no meu destino dos sonhos, estou na Itália. Sinto uma alegria enorme, não resisto e começo a cantar e dançar uma tarantella. O motorista italiano, que me acompanha pelo estacionamento até o carro e me levará ao hotel, olha surpreso e diz: 

– Ti piace la tarantella?

– Siiii! – respondo emocionada.

E ele começa a cantar junto.

É o primeiro momento da jornada que me mostraria muito mais do que poderia esperar. 

Hora do almoço, primeira refeição italiana. Estou na rua atrás do hotel onde estou hospedada, um lugar nada turístico, a procura de algum restaurante que aceite um novo cliente àquela hora. Quase imploro para que me deixem entrar no que mais me atrai. Um restaurante pequeno, encontrado ao acaso e que, para ser sincera, não lembro o nome. Peço uma pasta com frutos do mar. O sabor, esse nunca esquecerei. Na Itália é assim: come-se bem em quase todo lugar, até mesmo nos mais singelos, e já no primeiro prato é possível entender por que comida é considerada uma mistura de religião e arte para os italianos.

Surpreendo-me com a riqueza de detalhes do Duomo, aprecio as vitrines da Vittorio Emanuele, escuto Mozart no alla Scala, me perco pelas paredes do Castelo Sforzesco. Estou diante de A Última Ceia, de Leonardo da Vinci; a obra me faz lembrar a frase do filme Gladiador: “o que fazemos na vida ecoa na eternidade”.

Despeço-me da cidade tomando um aperitivo em Navigli. A luz dourada do fim da tarde reflete nas águas do canal, as pessoas estão alegres, o nhoque é saboroso. “Ciao, bella! Ciao, Bello”; os garçons do bar Manhattan cumprimentam uns aos outros e os clientes. Bella, bello… palavras constantes e que saem fáceis da boca dos italianos.

“Só posso trazer vocês até aqui. Daqui até o hotel, meu carro não pode circular”, diz o taxista. Chegamos à área de Florença onde o trânsito de carros é proibido. Não há problema, o hotel é perto e o caminho tem atrativos suficientes para retirar a atenção da distância a percorrer. Paro para ouvir uns rapazes que tocam violão na rua; é bello de emocionar. 

Largo as coisas no quarto e vou explorar a cidade. Fico hipnotizada com uma artista que performa na rua: alta, mascarada (na verdade, não sei se é um homem ou uma mulher), roupa brilhosa, luvas que simulam dedos e unhas enormes, movimento gracioso. Percebe que estou a olhar meio boquiaberta, me puxa com suas “mãos” enormes e me faz entrar na dança. Tiramos uma foto abraçadas. 

Sigo andando; quanto mais vejo, mais quero ver. Acho estranho achar tudo bello. De repente, entro numa ruazinha qualquer e sou tomada por um mal-estar. Sinto-me eufórica e começo a sentir um sufocamento, então começo a chorar. Só tempos depois descobriria que fui acometida pela Síndrome de Stendhal, ou Síndrome de Florença: uma espécie de estresse mental diante de tanta beleza e informações para processar. 

É a primeira vez que me emociono diante da arte e da beleza; até então, nem sabia que isso era possível. Até hoje, para mim, Florença é a cidade mais bella do mundo. Acredito que não há outro lugar com tanta arte relevante e tanta beleza por metro quadrado quanto ali. Minha passagem por lá cabe em outro texto, ou num livro.

Última parada da jornada italiana. Saio da estação Termini, olho a cidade pela primeira vez e penso automaticamente: aqui viveu um império! Tudo em Roma é grandioso. E grandiosamente bello!

Mais uma vez, largo as coisas no hotel e saio pela cidade. Chego na Piazza Navona. Sento-me na primeira mesa vazia que vejo, na calçada de um restaurante, e peço uma lasagna. A mistura do sabor com a vista da Fontana dei Quattro Fuimi, de Bernini, parece um delírio. O garçom se aproxima novamente e pergunta:

– Já foi à igreja de Santa Inês? 

– Não – respondo intrigada.

– É essa igreja aqui em frente. Não deixe de entrar lá. É de graça.  

Entro e não acredito no que vejo. O que a Igreja tem de discreta por fora tem de bella e opulenta por dentro. De repente, olho num canto e fico incrédula de novo: um Caravaggio! Àquela altura, já penso: coisa normal na Itália! 

Viro a esquina e não contenho a exclamação: ohhh! Estou diante do Coliseu. É muito mais bello do que nas fotos e vídeos. Vou ao Fórum Romano, ao Monumento a Vittorio Emanuelle, ao Museo Capitolino. No fim do dia, sento-me numa mesa externa do Eataly, de frente para Piazza della Repubblica, e falo sobre como tudo aquilo é especial. Durante quase toda minha vida, aquela viagem foi algo inacessível, então, realizá-la é uma vitória. Veni, vidi, vici: parafraseio Júlio César em pensamento. Minhas companhias compartilham do mesmo sentimento. As mesmas companhias que, no dia seguinte, compartilham comigo um banco dentro da Capela Sistina enquanto analisamos, deslumbrados, a obra prima de Michelangelo.

Viajar para Itália começa como um sonho e termina como um despertar: para a importância do bello, do gosto pela arte, do gosto pelas cidades. Penso se estaria melhor numa praia na Sicília ou numa trilha nas Dolomitas. Concluo que não. Essas são das criações divinas fáceis de gostar. O mesmo nem sempre acontece com o ser humano. Mas coisas como ver os detalhes do Davi de Michelangelo, apreciar a arquitetura do Trastevere ou passear pela Piazza del Popolo nos lembram que também podemos ser manifestação do belo, das coisas boas, e do divino. 

Jogo uma moeda na Fontana di TreviCiao, bella! Voltarei quantas vezes puder.   

ciao, bella! Florença
ciao, bella! Florença
ciao, bella! Roma
ciao, bella! Roma
ciao, bella! Roma
ciao, bella! vaticano
ciao, bella! Roma
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By Luzia é uma galeria e diário digital focados em fotografia, leitura e histórias de viagens pelas lentes e escrita de Luzia Cavalcante.

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